segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Dez motivos pra eu estar assim



1. Não há nada mais interessante no prazer do que a dúvida, e eu não sei se fico e te surpreendo com um cafuné, ou se compro uma passagem pra Uberlândia e não volto nunca mais.

2. Você caminha na intenção de chegar, dá passos largos, apressa-se mas pára, acende um cigarro e espera alguma coisa que eu não sei bem o que é. Sinto isso desde criança, quando corria loucamente procurando pelo café da minha avó, que é o mais gostoso que já provei, e desistia quando me lembrava que o calor me queimaria a boca. Isso é lindo. Você é linda. Me lembra coisas boas.

3. Quando você mexe no seu cabelo, me dá a impressão que todo o resto não interessa. Minhas filosofias, minhas intenções, minhas frases feitas, nada disso importa quando os seus dedos passeam da fronte a nuca.

3.1. Existe um provérbio marroquino que diz que dá pra amarrar um elefante com um fio de cabelo de uma mulher. Acrescento: se com um fio de cabelo de uma mulher dá pra amarrar um elefante, meu coração é fichinha.

4. Você sabe demais de mim. Isso já é um grande motivo.

5. Eu fico tão bobo quando me deparo com o infinito do seu olhar. Como assim chega de melodrama e vai explicando logo que bobagem é essa?

6. Meus amigos dizem que você combina em tudo comigo e que se eu perder essa oportunidade, eles vão rir de mim até o dia do juízo final. Não, eu não ligo para o que as pessoas dizem e pensam de mim mas, putz, isso é mais óbvio do que uma linha reta não fazer curvas.

7. Beleza, não precisa ficar com raiva que eu já vou ser mais objetivo.

8. Dificilmente nessa cidade eu vou encontrar outra gata como você. Outra com o seu sorriso, com as suas conversas, com a sua cabeça, com o seu jeito. Então é bom você indo se acostumar com a minha perseverança, que eu não entro no jogo pra perder. A não ser que seja pôquer, esse eu acho muito difícil e eu não garanto nada.

9. Você pensa no futuro e, assim como eu, procura por dias melhores, bebidas melhores. Tem o bom senso, e a loucura, dos que são apaixonados pela arte, pela boa música e pelo cinema iraniano. Mas não liga pra nada disso se a champagne estiver bem gelada.

10. Enfim, você é foda. Quer andar comigo de mãos dadas?

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Ainda há vida, Margarida.



Podia ser desespero. Podia ser só vontade de dividir a pipoca com alguém durante um filme do Fassbinder. Podia ser desejo, tesão, eros e coisa e tal. Podia ser a intenção de dar o braço a torcer. De dar o braço pra servir de cobertor em noites assim, frias. Podia não ser nada. Podia ser tudo. Podia ser viagem pra Floripa. Podia ser viagem na maionese. O que não podia era o silêncio.

Ela olhou de lado com aqueles olhinhos de vem, me pega, me pega com gosto, mas me pega com carinho pra não me machucar, deu um gole pesado no copo de cerveja e sorriu. Queria saber sobre mim, quantas carteiras de cigarro eu fumo por dia, quantos poemas eu já fiz, saudade eu tenho de quê e por quê que eu não me declarava logo. Afinal de contas, já passava das onze e ela tinha que ir.

Ela cruzou as pernas como quem diz vem e abre, descobre, desdobre e faça o que quiser de mim, mas vá com calma que tem gente olhando e eu sou uma menina de respeito, deu um trago no seu filtro vermelho e chorou. Contou-me da sua vida, da vida alheia e dos maus tratos às focas na antártida. Quis saber dos meus segredos, dos meus medos e eu consenti enquanto passeava os olhos nos seus olhos, peitos e coxas.

A gente se alimentou, hibernou, comeu de novo, fez silêncio, assoviou o Bolero de Ravel umas três vezes cada um, contou piada, riu, chorou, lembrou, pediu uma pizza e foi assistir televisão. Às três da madrugada ela tomou juízo e um táxi e sumiu. Deixou a louça lavada na pia, a metade da calcinha e um bilhetinho que dizia assim:

- Não volto mais. Não que eu não queira. Não que eu não possa. Não que eu não gostei. Só não volto mais. Não quero mais pular a janela do décimo quinto andar cada vez que encontrar você. Chega de sofrer e dar trabalho aos bombeiros. Chega de me ausentar de mim enquanto estou dentro disso aí que você vive. Adeus pra sempre, Margarida.

Pelo menos não o silêncio.