sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Ensaio do amor no carro.



De repente ela puxou a minha mão direita e encostou no seu peito esquerdo. Era hora de parar o carro. Parar a vida. Deixar o tráfego fluir. Seus olhos que pareciam qualquer coisa que eu não sei o que é, apesar de que naquele instante eu jurei saber e conhecer desde menino, me fitaram por alguns segundos. Ela me beijou. Me beijou como uma garota que eu amava no colégio, seu gosto de canetinha de melancia. Tudo era claro, os postes, as luzes, as putas com seus orgamos prolixos, os signos.

Eu que já tinha lhe pedido tantas desculpas, naquele momento era o credor dos seus perdões. Perdão por ter me rasgado a camisa e a sensatez, o banco do meu carro com a friccão das suas coxas, perdão por ter entrado com tudo, na contra mão, nos sonhos eventuais de um homem como eu, tão simples. Ali não cabiam frases feitas, de efeito ou coisa assim. Ali eram só dois corpos que se enroscavam perigosamente em um drive-in. Sexo, tesão, uma foda casual. Vontade de bicho.

Gozamos. Nos olhamos. Mão na nuca. After kisses. Liguei o carro e continuei o itinerário. Ela ajeitando a calcinha sob o vestido. Não podia entrar em casa e dar de cara com a avó assim. Eu ajeiteitando os meus sentidos ainda com as mãos no volante. Não podia dar de cara no real, ainda com tantos cheiros, gostos e sensações. Parei em frente ao seu portão e ela me pediu pra telefonar. Saiu. Sumiu. Não liguei nunca mais.

Luísa ia continuar com seus afetos com sabor de pra sempre, ia olhar outros olhos, rasgar outros bancos. Eu ia ser o mesmo frequentador de lugares comuns. Talvez não mais os mesmos. Talvez nunca mais tão desse jeito.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

That's all, girl.



É que quando eu for embora você nem vai saber. Quando aquele ônibus partir eu não vou olhar pra trás. Você sabe, é tarde. A vida não é como um bilhete ou mandar flores. Nada fica quando se nada tem. E você nem está aí. Tome este silêncio como um adeus.

Quando eu for embora, meu amor, minha protegida, embrulhe aqueles sorrisos que deixei na frente do seu portão enquanto nos despedíamos e mande por correio no endereço que virá a seguir. Ou esqueça. Ou guarde junto com aqueles horríveis relógios coloridos que te dei.

Você talvez nem se dará conta que eu parti. Quando eu embarcar cheio de malas e medos, não fará sentido passear meus dedos pelo telefone e me despedir. Estarei longe, cantando outras meninas e fazendo novos planos. E já nem me lembrarei de ti. Então, tome este momento como um beijo meu.

Quando eu for embora, nem lembrança e nem Neruda. Nem saudade e nem apego. Quando eu for embora, só as canções que lhe fiz, os presentes que te dei e o passado que ficou.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Das coisas que a gente deixa pra trás.



Acho que era teoria mesmo. Furada. Estava lá, os signos nunca mentem. Acho que a gente leu o zodíaco do jornal passado. Não era pra ser. Estava tudo errado. Você nunca entenderia. A gente nunca sabe o que quer. Isso se chama era dos extremos, Plutão não entra em Saturno. Marte não encontra Urano e nós éramos só vinho mesmo.
Uma vez eu atropelei um gato. Preciso te contar essa história. Fiquei anos lamentando e me martirizando por isso. Parei o carro, desci e fui procurar o pobrezinho no asfalto. Eu devia ter passado com tanta velocidade que não sobrou nada. Nem rastro. Outro dia, no mesmo lugar, o mesmo gato zoneava com duas crianças na beira da pista. Era ele. Lindo, grande, gordo e cinza. Vivo.
O mesmo aconteceu com a gente. Quando acreditei que tinha passado a toda pelos seus sonhos, pelos seus planos e seu colorido, me vem você, cheia de sorrisos, brincando na beira de tudo. Viva.
Não há por que olhar pro céu, para os os planetas e fantasiar intenções. O nosso dia é a gente que faz. Não vamos botar a culpa no sistema solar. Pode ser que venha um asteroide e acabe com tudo. Como eu fiz com o gato que não morreu. Como eu fiz com você que nem sentiu.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Foi-se.



Duas da manhã e o telefone toca. A gente precisa conversar. Pô, tem que ser agora mesmo? Claro que sim, por quê, pra você não dá? Você não entende mesmo essas coisas. Tudo bem, vai, fala. Mas fala baixo que eu ainda não acordei direito. Sabe, pra mim não dá mais. Não dá o quê, meu amor? Ah, sei lá, acho que a gente se precipitou, tá acontecendo rápido demais, isso tá me sufocando... Tá, entendi. Você andou bebendo? Aí, tá vendo como você é, te ligo pra me abrir e você fica com essas bobagens, a Claudinha é que estava certa, você é um escroto mesmo. Precipitação, rapidez, Claudinha, escroto, beleza, vai falando aí que tô ouvindo, vou só beber água. Não. Pra mim já deu. Vou desligar. Não dá pra ter uma conversa adulta com você.

A gente se conheceu numa festa lá em casa, trocamos umas ideias, tomamos um vinho, deixamos o vinho nos tomar e bam! Lá estávamos nós, transando bêbados dentro do carro, o vidro embaçando, a chuva caindo e a gente se perdendo. Era pra dar tudo certo se nós não fossemos tão errados. Ela tinha muitos segredos que não cabiam nas minhas metáforas. Eu tinha muitos desejos que não respeitavam suas cláusulas. Aí dá nessa. Duas da manhã o telefone toca.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Porranós! ( Ou deixa )



Deixa que o amor é meu. Dou pra quem quiser. Agradeça se foi pra você. Mas deixa, que mal mesmo ele só faz a mim. Deixa que eu me faça um estrago, que eu me foda. Deixa que o amor é meu.

Deixa eu te sentir em saudade que, pra te dizer bem a verdade, nem dói tanto assim. Deixa que eu te sinta mesmo distante, que eu te queira, que eu te zombe, que eu te cante. Deixa, que isso logo passa e daqui um tempo você nem vai lembrar de mim. Deixa que o amor é meu.

Deixa que o amor é meu. Fico com ele, se for o caso. Se a você ele já pertence, simplesmente deixe. Deixa que de você ele só quer o bem. Deixa ele ele se fazer de vítima. Deixa ele parecer um otário. Mas deixa. Deixa que o amor é meu.

Deixa pra lá, você nem quer mesmo saber. Deixa na memória. Deixa na lixeira. Jogue tudo fora mas deixa. Deixa que essa porra de amor é meu. Não vá me julgar pelo meu carro sujo, pela minha barba por fazer, que eu não julgo você por nada que é seu. Então deixa, deixa que o amor é meu.

Deixa que o amor é meu e eu amo quem eu quiser. Você, ninguém, eu. Não precisa se preocupar que eu não sou nem um louco, talvez um pouco, mas deixa. Deixa que este amor é de Deus. Ou melhor, deixa que esse amor é meu.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Sobre vocês dois.



Aquela velha cara de bobo volta a lhe esculpir o rosto. Não há mais como negar e seus atos já não obedecem a razão que, desde menino, era sua mais irrevogável característica. Já se apaixonou por outras, é fato. Mas a feição de cachorro sem dono desta vez tinha mais sentido do que nunca. Puta que o pariu, que se foda essa porra de sentimento escroto. Não queria se apaixonar. Já não podia se apaixonar. De repente, como num legítimo, porém não menos paradoxal gavião, que voa o mais alto possível mas se deixa cair livre e loucamente na captura de sua presa, ele se jogou. Dane-se, não haviam chances de conviver com o que sentia sem a presença dela por perto. E foi então que a cegueira lhe tomou os olhos, a timidez invadiu a boca, a loucura os ouvidos e sua face se transformou na alegoria de uma paixonite dos quinze anos de idade.
Certo dia, ele olhou com mais calma no espelho e viu que não era tão ruim assim. As sobrancelhas estavam arqueadas e lhe conferiam um ar misterioso. O blasé que sua egotrip demostrava, agora era risada alta na madrugada. Com os tímpanos mais aguçados dá-se pra ouvir melhor as incertezas que ele tanto se amarra. E o olfato? Que coisa boa sentir a leveza das coisas leves, o cheiro da insegurança se transformando em delicadeza. Como num passo de mágica, ele passou a se encarar bem melhor. Foi aí que ele vestiu o seu melhor sorriso e saiu pra levá-la ao trabalho.
Se você estiver aí, isso mesmo, você que ele tanto ama, estiver lendo esse apelo de um amigo que não aguenta mais esse lenga lenga, por favor dê sinal de vida. Escreva que é recíproco ou o mande pra casa do caralho no seu mural do Facebook. Mas faça alguma coisa, eu já não aguento mais.


quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Ele e, talvez, ela.



Ele já acabou com tudo. Os dedos egocêntricos já não passeam pela nuca e os livros, estupidamente, definharam com os pingos de café das noites em claro. Definitivamente ele não era mais o mesmo. Sem seus discursos pseudo filosóficos, sem as bebedeiras homéricas que, vez ou outra, lhe conferiam até um certo charme, sem boca, sem pernas, sem sentido e sem razão ele anda caminhando a esmo. Ele, que antes disso por tantas vezes fora insultado na rua por mães alucinadas, pedindo ora pra sair da vida de suas filhas, ora pra mendigar alguns esparcos instantes em sua companhia, agora não tem prazer em outros corpos e, talvez por isso, andam até dizendo por aí que ele enlouqueceu. Tudo por ela.
Ela também o amava, mas amava de outro jeito, de outras formas de amor. Ela se amarrava no jeitinho apaixonado dele mas, no fim de tudo, não dá pra se amarrar e amar, três letras ficariam de fora dessa loucura. Com aquela coisinha dentro que só quem se perde acha, ela o conquistou. Sem querer, sem palavras e jogando o cabelo pra trás. Não há o que entender. Tampouco o que se explicar. Ela o ama, mas ela não o quer. Ele que morra de saudade em algum hospício qualquer.
Os dois se encontram quase todo dia e sem perceber vão se perdendo. Ele vai se acabando. Ela, coitada, já está no barco. Acho até que um dia eles vão se casar. As coisas mudam, cara. Amanhã é outro dia. A festa vai reunir os velhos amigos. A nova casa se encarregará de abrigar o velho amor. Perdidos provavelmente envelhecerão juntos. Mas que seja logo. Antes que ele se acabe e ela se perca.