domingo, 22 de dezembro de 2013

Balada de migração.



A loucura do amor incontestável: o ratinho se ferrou indo atrás do queijo. E se hoje me perco, o prazer da dúvida ainda me respalda: ei, quem era o rato? diz aí, quem era o queijo? Se há algo de belo nos sete pecados capitais da formação do pensamento, Peirce não explica. Kundalini. Correntes telúricas. Deixado de lado eu tenho plenos poderes para acreditar no que quiser. Isto se eu quiser. Umberto Eco, um beijo pra você!

A saudade ainda aprisiona. Fato desconsiderado em pleno século vinte e um onde máquinas decerto ainda amarão mais que os seres humanos. Vai crescendo como um feto na barriga do tempo e não há escolas que deem vaga pr'uma criança tão rebelde. Eu sinto falta de você e dou risada - quem é capaz de ouvir o silêncio é mentiroso. Ninguém sente a falta de alguém. Quanta bobagem.

E a ratoeira aparece como um objeto esquisitão de um filme do Fritz Lang. Ela tem muito a nos dizer. O quê? E nessa de procurar os signos inefáveis, encontro um fio de cabelo seu repousado no carpete do carro. Dou meia volta, espero um pouco. Quando a gente vê o mesmo novo de sempre nem dá mais pra fazer cara de espanto. Tive vontade de voltar no tempo. Que tempo? E eu dou de cara mais uma vez com o eterno retorno justamente quando a torcida adversária vai gritando alucinada: ei, Nietzsche, vai tomar no cú!

A loucura do amor incontestável: amando, loucos, o que constatamos além dos nossos olhos marcados de lágrimas passadas? E que juras foram estas que fizemos que, sordidamente engarrafadas, nem mesmo foram lembradas na ressaca? Inconteste amor louco, apresso-me de novo em refazer meus votos: gosto de você e me sinto um velho amigo seu. Amor de incontestável loucura, meu sonho de criança que hoje vagueia pelos meus pensamentos absortos, nem imagina a delícia de enlouquecer por você.

A loucura do amor incontestável: palíndrome oculta da vida. O verso que não nasceu pra ser revisto. Nem mil Marílias encantariam mais Dirceu, não mais para Lilía Brik o futurista Maiakovisky ofertaria seu poema-anel. Depois de você é só. De resto eu ainda guardo uma foto sua.

domingo, 8 de dezembro de 2013

Amadurecimento.



Eu queria um dragão. Que cuspisse fogo, de preferência. Algo que representasse a linha tênue entre a selvageria e a delicadeza dos contos de fada, a eloquência mitológica das batalhas principescas medievais como alegoria de uma sociedade que busca um lado pra acreditar, a ideia de um ser implacável no céu e na terra e coisas do tipo. Ela disse que isso era bizarro. Daí a gente tatuou o símbolo do infinito no pulso mesmo.

Depois de um ano de namoro ela falava orgulhosa para os nossos amigos em comum o quanto eu tinha mudado. Agora eu só jogava vídeo game escondido e atuava até bem quando o assunto era música pop. Aposentei minha coleção de autoramas, meus gibis do Stan Lee e minha Telecaster azul. Aprendi, não sem muita relutância, a lógica de ter que fazer a barba pelo menos de três em três dias. E ela parecia feliz quando eu me adequava pouco a pouca à sua vida. Mas não. 

Foi quando eu estava quase parecendo um retrato falado de tudo aquilo que nunca quis ser que ela chegou e disse "Você não é mais o mesmo. O quê que aconteceu?". E ponto. E deu vontade de vomitar todo o sentimento de revolta por estar usando aquela bermuda jeans salmão só pra combinar com seu vestidinho pastel. "Acho que é o cabelo", respondi, tentando parecer engraçado e engolindo pra dentro meu desconforto. "Não, você mudou. Eu sabia que eu iria me decepcionar. Minhas amigas sempre me disseram que você não teria a capacidade de amadurecer, de deixar de ser criança um dia!" Ouvi calado. Não me aparecia uma frase em mente que não começasse com um xingamento e terminasse com outro. E ela chorou por ter falado sozinha. Que sentia vergonha por ter gente olhando seu barraco e me abraçou. Restou-me mudar o foco dizendo que gostava muito dela. E ela propôs que fizéssemos uma tatuagem que simbolizasse nossa nova fase. Nossa evolução como casal. Puto que sou, aceitei.

Hoje nossas peles são páginas viradas. Não quero contestar os motivos. Não há um "se". Se eu tivesse sido diferente, se eu tivesse me interessado mais, se não houvesse me deixado levar. Fomos o que demos pra ser e isso, brega como a tatuagem que você escolheu, foi o que ficou. Não que eu não tenha aprendido nada com isso. Usando lente de contato posso brincar de Clark Kent virando super homem sem topar meu pé na porta. E você pode fazer como a moça da revista tatuando um sapo por cima. Acho que tô mais pra dragão, mas você anda dizendo por aí que foi isso que seu príncipe virou.