terça-feira, 22 de abril de 2014

Filosofia do tato.



Era tudo seu e eu nem sabia. Cada parte daquele lugar tinha uma coisa que, por mais indecifrável que fosse, lembrava você. E eu te dava bom dia sem saber que você era dona de tudo aquilo. Dona por que ali tinha um toque seu. Não um toque na decoração da sala ou no design das saboneteiras de aço escovado do banheiro. Eram toques, marcas de dedo e suor no armário, na prateleira, na garrafa de café. Bobo como sou, também fui me encostando devagarinho, pouco a pouco, e me perdendo neste orgasmo alquímico de sentir você onde você já não estava mais.

Um dia eu também não estava mais lá e tudo era frágil demais para que alguém se desse conta. Mas suas digitais ficaram nas minhas digitais como um menino que não quer largar o doce, como a loucura não larga a película de Buñoel. E eu vou te levando com o cuidado e a delicadeza que merecem os seus grãos de matéria invisível na ponta dos meus dedos. Guardo para sempre cada pouco que for seu.

E, penso agora, nossas mãos, de fato, nunca se encontraram. Mas, como tudo, o papel do sonho de valsa que te dei, em algum lugar, também é detentor do nosso aperto comovido e inexistente. Um pedacinho de papel de bombom a vagar por aí carregando toda a sentimentalidade que é só nossa. Aqui comigo a certeza desesperada de te encontrar logo, em carne viva, para um encontro de corpos menos informal.

Só eu, eu e o caracóis que vivem a roçar por aí, sabemos que alguma coisa fica deste toque. Senão a eternidade, pelo menos o rastro que mostra o caminho.

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