quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Quando a gente não escolhe mais.

Quando eu te conheci você tinha certeza de tudo e, aos poucos, fui me apaixonando pelo seu jeito resoluto de lidar com as coisas mais complexas como escolher entre um cineminha ou tomar um porre de tequila. E fui me perdendo, me deixando desaparecer ao seu lado e nem vi quando você deixou de ser essa pessoa que tinha tudo preparado pra se tornar alguém que não pensava em nada mais do que suas próprias decisões.

E eu  fui ficando ali de lado, fazendo parte da mobília, esperando você se definir. Juntando grana pra comprar um carro mais novo, escolhendo aquela cômoda vintage, fazendo a moça da loja mostrar e dobrar todo o estoque de roupas do mostruário. De vez em quando até batendo meus pés despudoradamente no assoalho na esperança de que você notasse que eu também estava ali esperando uma definição: ei, e nós, como é que fica?

Você sempre com seus assuntos para serem resolvidos urgentemente, seu telefone insuportável que nunca parou de tocar, mudando a ordem das almofadas da cama e quase sempre optando por lençóis de solteiro. Eu ali no canto, insistindo em silêncio que você ainda pensasse na gente, que parasse um pouco pra perceber que sim, sempre gostei de tudo como estava, nada precisava mudar além da direção dos seus olhos.

Até o dia que eu não estive mais afim de esperar você resolver a sua vida. Por que sempre foi assim: a sua vida e nunca a nossa vida. O dia que eu também decidi descongestionar a minha, pôr minhas coisas no lugar. Sei lá, de repente pra que você caísse na real e sacasse que talvez eu tenha me apaixonado por aquele carro que só pegava no tranco, que eu sempre achei melhores as velhas almofadas que guardavam seu cheiro e que aquela cômoda que você gastou uma nota pra comprar me fazia ter pesadelos. Mas naquele momento você tinha coisas demais pra pensar e, mais uma vez, esse assunto ficou pra depois.

Ontem a noite sua mãe me ligou, disse que você anda meio deprê, que perdeu a vontade de sair nas sextas feiras e que fala de mim o tempo inteiro. Bom, ainda gosto de você se quer mesmo saber. Mas estou feliz e tenho a impressão que já é tarde demais pra nós, não acha? Espero que você se cuide e que tenha mais clareza nas suas próximas definições, que você saiba decidir o que é prioridade e sempre opte pelo calor de um abraço à trabalhar até mais tarde pra comprar um ar-condicionado. Quanto a nós, sinto muito, agora não dá mais.




quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A última vez.

A primeira vez que o amor me pegou eu estava atravessando a rua de mãos dadas com meu avô. Era de noite e eu vi um caminhão de mudanças parado na frente do portão da menina mais bonita da escola e, nessa noite, ainda muito menino, eu percebi o quão dolorida era a beleza de gostar de alguém.

A segunda vez que o amor me pegou, me lembro bem, entendi que a gente se apaixona mesmo é pelos detalhes: um sorriso bobo na fila do lanche, um abraço sem contexto, o jeito como alguém ajeita a roupa quando se levanta. Falo isso por que a segunda vez que o amor me pegou foi por uma das gêmeas idênticas da quarta série, tão iguais que até a professora se confundia. Mas eu não. Poderia listar cada minúscula diferença que fazia eu suspirar por uma e não por outra.

A terceira vez que o amor me pegou eu também me senti amado e o nosso primeiro beijo seria um daqueles momentos perfeitos para ilustrar uma juventude curiosa, cheia de dúvidas e tão carente de certezas. Mas acabou. Ficou o aprendizado de que o sentimento tem lá seu manual oculto de sobrevivência - um passo em falso e bam! tudo está acabado.

Meus amores número quatro, cinco e seis também me pegaram de jeito. Cada um à sua maneira mas todos com o mesmo ensinamento: paciência e vodka curam qualquer ferida. Amores que deixaram marcas importantes em mim, marcas que doeram absurdamente pra cicatrizar e que hoje servem de lição como um joelho ralado tanto pode significar que correr nem sempre é a melhor ideia como uma lembrança de que a brincadeira foi do caralho. Pro resto, Merthiolate.

A última vez que o amor me pegou eu tinha tinha um plano preparado: resolveria tudo com uma boa dose de Vinícius de Moraes e algumas rosas vermelhas. Mas as coisas não são tão simples como eu esperava e novamente me perdi quando você elogiou qualquer coisa em mim. Meus óculos, minha voz, sei lá, não lembro. Eu poderia apenas ter dito obrigado e continuar meu caminho habitual, mas a vida é feita de escolhas, baby, e a minha foi, a partir daquele momento, te amar pra sempre sem deixar o próximo amor acontecer.






domingo, 13 de setembro de 2015

Amor e carinho acompanha.


Não gosta de coisas pela metade aquela moça. Não, definitivamente ela odeia o copo meio vazio, as conversas interrompidas antes do final, os passos que não chegavam a lugar algum. Tinha nascido pra ser inteira e, por isso, acorda todo dia proclamando sua independência na frente do espelho. Nunca sai de casa com um destino certo, certeza mesmo era só a de que vai chegar onde quiser. Basta um batom vermelho, a grana pro táxi, um sorriso escancarado e o infinito pousa na palma da sua mão como um passarinho atrevido. 

Que a verdade seja dita: toda fortaleza também tem suas brechas e pontos fracos. E ela observa com uma ternura desproporcional aos seus um metro e sessenta e nove os casais de mãos dadas pelas calçadas como se pudesse absorver o que quer que fosse daquelas sutilezas apaixonadas. Também tem vontade de se perder e nunca mais se encontrar dentro de um abraço mas, sabia bem, aquela talvez não fosse a hora certa.

Nunca teve muito apego às coisas materiais aquela moça. Sempre achou que eram muito mais valiosos os presentes que o dinheiro não pode comprar. Um beijo lambuzado de sorvete de flocos, por exemplo. Ou os olhinhos daquela melhor amiga quando se encontram no shopping. Acredita que o mais caro, na verdade, nunca teve preço. Por isso sempre opta por tomar um chopp com a galera do que trocar o celular.

Sabe, ela até gosta de yoga, de uma tal de meditação transcedental e vive postando textos de algum indiano com a sabedoria milenar de ser foda. Mas ela anda tão sem tempo que prefere tratar suas angústias, neuras e paranóias bebendo uns bons drinks com a velha turma de sempre, no mesmo bar de sempre, aquele que ela chega dando oi pra todo mundo e chamando o garçom pelo apelido carinhoso e pessoal. Traz mais uma, Bigode, pra equilibrar o chácra!

Aquela moça é linda apesar de não ser a mais bonita. Talvez não tenha exatamente os predicados de uma top model mas isso não a impede de ouvir um fiu fiu vez ou outra atravessando o sinal. Aquela moça tem orgulho de voltar na padaria e devolver o troco que veio a mais. Orgulho de acordar cedo e trabalhar feito gente grande pra pagar as contas do mês. Aquela moça gosta do copo cheio e de tudo que vem acompanhado de amor e carinho.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Assim seja.

Hoje vai ser a última vez que te escrevo. A última vez que vou me lembrar que cada foto sua me faz um bem imenso e a última vez que te prometo as coisas mais bonitas esta noite. Hoje, e por enquanto, nada mais vai me fazer faltar o ar, nada mais vai me prender o pensamento; nem livros, nem trabalho, nem nada. Hoje, a última vez que te escrevo, vai ser o dia que seremos felizes para sempre em cinco parágrafos e algumas outras linhas.

Não que você tenha alguma coisa a ver com isso, mas é foda pra mim. Já não tenho mais idade pra ficar me propondo ao abate sentimental de ficar puxando assunto dia sim, dia não, na internet esperando qualquer migalha de atenção da sua parte. Mas até que eu estava gostando de me sentir com quinze anos de novo, na larica da mocinha sorrir da piada mais sem graça. Não nego e acho até que me aturar deve ser um exercício constante de paciência. Só que acabou. Hoje é a última vez que fico bad ao ver você com outro. Hoje, a última vez que te escrevo, só quero lembrar do que foi bom.

Dói pra caralho, sabia? Dói por que eu cultivei você, reguei você, fiz de tudo para que você florescesse em mim da forma mais bonita. Só que anda doendo demais e isso não é bom. Não adianta eu vir com as conjecturas mais poéticas de que o amor é assim mesmo, que é necessário todo esse sofrimento para servir de inspiração para os meus textos mais avassaladores. Sou do século vinte e um, baby, tente me entender, lido melhor com vídeos games do que com poemas de amor.

No mais, você não tem quase nenhuma culpa nessa história afora o fato de poder ter me dito não há algum tempo atrás. Culpa por não ter sido estúpida o bastante pra dar o fora logo de cara e insistir em me levar em banho maria até hoje: o dia que não dá mais. O dia que esquecerei amanhã junto com a cor dos seus cabelos. Junto com todos os momentos que me senti o mais imbecil por falar as coisas mais profundas tão fora de hora. O dia em que decidi parar de escrever pra você.

Bem provável que eu não deixe de gostar de tudo que habita em mim quando penso nos seus olhinhos caramelos e que nenhuma outra moça que eu tente usar como escudo fará com que você deixe de estar presente em cada acorde da minha guitarra. É foda. Mas deixa. Você está feliz e eu quero que continue assim. E, pra te dizer a verdade, na vida eu sempre consegui tudo o que eu quis. O lance é que agora eu não quero mais. Ponto final.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Dentro de você (ou uma flor que brotou no asfalto).

Imagine a cena: de um lado da mesa um cara chora. Mas chora muito, copiosamente. Que fique bem claro, este sujeito não sou eu. Nesta história, pelo menos, eu sou apenas o observador maduro que tende a assistir a tudo com um olhar empírico. Do outro lado você sente sono, vergonha e só. Passa a mão pelo cabelo, checa as mensagens no celular, dá uma bocejada bem-servida de desprazer e pede a Deus em silêncio que aquela noite chegue ao fim.

Bom, o chorão em questão poderia ser aquele amigo ativista desolado pelo derretimento das calotas polares, poderia ser um colega de trabalho se lamuriando pela não promoção ou até mesmo um bêbado que se sentou sem a sua permissão para declamar dramaticamente um poema da Florbela Espanca. Mas aquele cara, baby, é só um rapaz qualquer que ficou putamente feliz em te encontrar naquele barzinho e, sei lá, por um descuido da sua sanidade resolveu puxar uma cadeira e se sentar com você.

De longe não dá pra saber direito por que ele ficou tão triste de uma hora pra outra mas eu tenho lá minhas sugestões. Um: ele pode ter perdido a carteira e, ao ver um rosto conhecido, correu pra pedir ajuda. Dois: depois da terceira dose ele se lembrou do cachorro que fugiu no parque e nunca mais voltou. Três: era uma nuvem carregada e bastou uma mudança no clima para ele virar tempestade. Pela minha experiência acredito de olhos vendados na última opção, mas que vento forte era esse para desabar tamanho temporal?

Você faz um gesto tímido para o garçom que já conhece bem a deixa; era a hora de trazer a conta. Seus olhos já não escondem o tédio por estar ali vendo um cara barbado se declarando entre lágrimas e martinis com gelo e limão. Só queria ir pra casa e fazer o de sempre: entrar na internet, fuçar todos os sites de textos apaixonados só pra postar no facebook aquele que melhor combinasse com seu vestido de solidão. Depois dormir e sonhar com o príncipe encantado que vai até tão-tão distante a bordo do seu cavalo branco, enfrentando ogros e dragões pelo caminho, só pra encontrar você perdida na torre mágica.

No fundo, no fundo acho que você gostaria mesmo era de dar um tapa na cara daquele idiota. De dizer pra ele que amores reais são uma grande furada, que se declarar para a pessoa amada passou a ser blasé há três anos atrás. Que esperar e nunca falar é hype. Que talvez tenha medo de se arriscar. Que toda aquela cara de bunda é só uma armadura da moça frágil que se tornou. Que morre de vontade de se entregar loucamente e que poderia ter ficado a noite inteira ali ouvindo aquele cara se abrindo da forma mais bonita e verdadeira que já viu e ouviu. Que não importa o que aconteça: o importante é a caminhada, o resto é só calçada.

Apertou o botão de compartilhar e esperou as curtidas subirem. Mas essa noite você sonhou com ele. Tenho certeza.